Um dos momentos mais gratificantes da curta passagem pela bela
zona de Assuão, a antiga Siena greco-romana e a Suanit faraónica,
é o passeio de feluca, que dura cerca de uma hora, entre a margem
oriental (onde acostam os grandes barcos de cruzeiro) e a margem
ocidental, para visitar a típica «aldeia núbia», um dos aglomerados
locais que recebeu parte da população deslocada pela construção
da Barragem de Assuão em finais dos anos 60 do século passado.
Navegando de feluca, por entre as muitas ilhotas do Nilo em Assuão
(do antigo egípcio suanit, que significativamente quer dizer comércio),
podem ser apreciados alguns rochedos com inscrições hieroglíficas,
como aquela que se vê na segunda imagem, gravada no bloco granítico
onde se detetam os níveis de subida das águas ao longo dos milénios.
O texto hieroglífico apresenta a titulatura completa do rei Psametek II,
da XXVI dinastia saíta (Época Baixa), o qual teve um curto reinado
de apenas seis anos (594-588 a. C.), o suficiente, porém, para enviar
uma expedição contra a Alta Núbia (Kuch) e deixar várias inscrições
como aquela que aqui se apresenta em duas colunas de texto vertical.
Quem se oferece para traduzir o texto hieroglífico?
Disponho de algumas fotos disso. Uma em que estou presente, pelo menos, parcialmente...o fotógrafo não foi muito bom...enfim...
ResponderEliminarBom, como nenhum dos escribas do blogue quis traduzir a inscrição hieroglífica do bloco granítico de Assuão, e como nenhum dos leitores do blogue se ofereceu como voluntário para a tarefa, aqui vai a tradução da titulatura de Psametek II, que reinou entre 595 e 589 a. C., na XXVI dinastia:
ResponderEliminarA coluna vertical à esquerda, que se lê da direita para a esquerda (de acordo com a disposição dos signos), começa com o nome de Hórus do rei, que era Menib (ou, como alguns preferem, na forma completa de Menibré, com o significado de «Estável é o coração de Ré»), inscrito dentro do típico serekh. Vem depois o nome das Duas Senhoras (Nebti), aludindo às deusas protetoras do Alto Egito (que era Nekhbet) e do Baixo Egito (a deusa Uadjit), com o nome de Useraui, isto é, «De braços poderosos»). Segue-se o nome de Hórus de Ouro, que era Senefertaui, «O que embeleza as Duas Terras», ou «O que torna feliz as Duas Terras».
A coluna da direita tem leitura da esquerda para a direita, em claro afrontamento estético-gráfico com a coluna ao lado, e inicia com o nome de rei do Alto e do Baixo Egito (nesu-biti), inserido dentro da tradicional cartela, onde se lê Neferibré, ou seja, «É belo o coração de Ré», depois segue-se o quinto nome da titulatura, o nome de filho de Ré, também dentro de uma cartela, nela figurando Psametek.
Vem depois um remate eufórico com a forma ankh-djet, ou «Que viva eternamente», seguindo-se «Amado de Khnum, senhor da catarata» (o que soa muito bem na zona de Assuão-Elefantina, onde Khnum era venerado) - e os alunos que na Faculdade de Letras de Lisboa frequentam a cadeira de Escrita Hieroglífica percebem logo que há aqui um fenómeno de anteposição honorífica.